Epidemias, Saúde Mental e Fake News

Sobre o coronavírus, sabemos que é um vírus de baixa mortalidade porém de altíssima infectividade. Sabemos que o mesmo é capaz de infectar um número muito grande de pessoas em pouco tempo. Devido a esta velocidade, ele causa uma sobrecarga no sistema de saúde com esgotamento de leitos hospitalares e de tecnologias para suporte clínico (manter vivo um paciente em estado grave), em especial as máquinas para respiração artificial. Portanto, ainda que os números demonstrem uma baixa mortalidade em relação a vírus como o Ebola, pelo grande número de casos, a situação é grave. No momento, a medida mais eficaz para diminuir a pandemia é o isolamento social.

Apesar da facilidade hoje em dia de se obter informações cientificamente confiáveis, com uma simples pesquisa no Google, ainda assim, nos vemos surpreendidos por inúmeras correntes de fake news em especial pelo whatsapp, com teorias de conspiração, acusações absurdas contra o povo chinês mal disfarçando o racismo e a xenofobia, ou no outro extremo, negando a gravidade da doença, apesar dos fatos contundentes a respeito.

Este uso do fanatismo como defesa, é claro, não é um fato novo. Ao longo da história da humanidade, as religiões e partidos políticos agiram durante as epidemias, algumas vezes acertadamente, fazendo a população se cuidar frente a doenças contagiosas, mas muitas vezes levando a guerras e genocídios, na busca por um grupo humano de inimigos que fossem culpados pelas doenças.

Muitas perguntas sobre o coronavírus ainda estão em aberto. Quando teremos uma vacina? Algum medicamento eficaz para o tratamento? O vírus causa sequelas? Haverá imunidade para aqueles curados da doença? Provavelmente, pelo aumento da velocidade dos trabalhos científicos em todo o mundo, essas perguntas serão respondidas, mas infelizmente não a tempo de mudar o curso da presente pandemia. Lembramos que doenças por vírus, pelos conhecimentos atuais da medicina, não costumam ser tratadas ou curadas por medicamentos (antivirais). Temos o exemplo da gripe, com um único antiviral (oseltamivir) o qual não se mostrou incapaz de curar um número importante de pacientes, a herpes com um antiviral que não suprime o curso da doença (aciclovir), e o HIV, que necessita de três ou mais antivirais para controle, e sem perspectiva de cura.

As doenças virais até o momento têm sido controladas e até erradicadas (eliminadas) com as vacinas. Muito provavelmente este seja o meio de evitar futuras epidemias do coronavírus. Um fato é certo: somente a ciência poderá trazer uma solução para a presente crise. Infelizmente esta não chegará de forma tão imediata como estamos acostumados. Precisaremos desenvolver um grau de resiliência que não foi nos cobrado até o momento, ao menos pelas gerações mais jovens. Então, fica a pergunta: Como nos posicionar frente a este desafio?

A Pandemia do Coronavírus e a Saúde mental

Estamos assistindo assustados à pandemia do coronavírus. Para muitas pessoas, uma situação apavorante e inédita. Nós nascemos numa época de impressionante avanço da Medicina, em que aparentemente todas as doenças tinham tratamento ou prevenção. A maioria de nós, aliás, não costuma se lembrar que as dezenas de vacinas às quais são submetidos os nossos bebês continuam necessárias justamente porque são doenças que não têm tratamento eficaz, que podem levar à morte e a epidemias ainda piores do que esta que estamos presenciando. Soma-se a isso a um pensamento característico dos países ocidentais, de negar a doença e a morte, ligado a um individualismo exacerbado  – o que não afeta diretamente a mim, não me interessa – e vemos como consequência o desespero frente a fatos que devem ser encarados como parte da vida.

A doença e a morte são fatos duros da existência. Não estou aqui pedindo que ninguém represente um papel de herói ou mártir. O que eu quero mostrar é outra questão, que  o sofrimento é inevitável, porém este é exacerbado justamente pelo individualismo e pelo imediatismo: quando olhamos as dores apenas sob o ponto de vista individual, e apenas no momento presente, estas se tornam insuportáveis, levando a extremos de psicose e suicídio.

Por outro lado, se nos sentimos parte de uma sociedade ou de uma família, se o sofrimento pode ser compartilhado, grandes dores e perdas podem ser suportadas e até trazerem grande crescimento pessoal. Além disso, a perspectiva no tempo também ajuda. Se olharmos a história da humanidade ao ter passado por inúmeras epidemias, praticamente sem nenhum tratamento ou prevenção eficazes, observamos o fato concreto e biológico de que o nosso sistema imunológico, em uma porcentagem das pessoas, foi capaz de debelar a doença sem nenhuma ajuda externa.

A Ciência como resposta a pandemia e ao fake news

A atual pandemia não atingirá a tragédia da Gripe Espanhola de 1918 nem da Peste Negra ocorrida na Idade Média, porque a humanidade atingiu um nível de avanço tecnológico e social irreversível. Atingimos um nível de tecnologia capaz de conectar pessoas a distância de forma impensável há 40 anos atrás. Esta será a primeira pandemia com grande parte da humanidade com acesso à internet, e mesmo com todas as fake news, com certeza que o nível de sofrimento psíquico será muito menor do que em outros tempos.

Nós, como humanidade, só sobrevivemos até hoje por sermos seres sociais. Como seres sociais, criamos tradições, entre elas a religião, e criamos espaços de poder, entre eles a política, onde existimos como seres sociais. Porém, sendo fatos da natureza, somente a ciência poderá trazer novas perspectivas e salvar a humanidade do grande sofrimento causado pelas doenças.

Embora a religião, a política e a tradição continuem como necessidades básicas do ser social, a ciência, neste momento, demonstra mais uma vez seu papel fundamental na nossa existência. Esta será não apenas o único meio de resolver questões de ordem natural, mas também fonte de verificação da verdade e de uma ética capaz de unir toda a humanidade, independente de religião, opção política ou nacionalidade.

Quando aprendemos a olhar as nossas vidas com uma perspectiva mais ampla, incluindo situações desesperadoras como uma pandemia, atingimos um progresso mais próximo de um ideal de saúde mental.

Dr. Felipe Damazio Pacheco – Médico Psiquiatra
Clínica Singular – Guarulhos
Tel.: (11) 2447-0180

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Psicóloga Responsável Beatriz Kramer – CRP 06/123196

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